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As extranhas entranhas de um corpo-coisa

Parêntese #306

As extranhas entranhas de um corpo-coisa
Luíza Fischer no espetáculo solo Meada. Foto: Diogo Vaz

Na minha agenda de 2025, quartas-feiras se tornaram dias de acompanhar estreias de espetáculos de dança. Dia 26 de novembro não foi diferente, mas foi. Não foi diferente porque era mais uma quarta-feira de mais uma estreia de mais um espetáculo de dança. Não foi diferente, mas foi. Foi diferente porque era a estreia não só de Meada, mas também de Luíza Fischer, que, na Sala Álvaro Moreyra, entregava ao público seu primeiro solo. Foi diferente porque se tratava de um espetáculo do Coletivo Moebius, do qual, junto à Luíza e a outros artista, fui fundadora, e do qual me afastei há algum tempo. Aqueles compromissos da vida que separam caminhos; aquele fio da meada que perdemos.

Meada começa com Luíza em cena, parada, em pé, com os olhos fechados, sozinha. A luz acesa nos permite acessar o espaço vazio, a sala nua, e um figurino belíssimo, a carne crua. A luz apaga. Silêncio dentro e fora da cena. A luz acende, recortando o rosto de Luíza. Ao abrir os olhos, ainda que não me veja, ela olha exatamente na minha direção. Seus olhos começam a percorrer o espaço, inquietos, incrédulos. Não está tudo bem. Há um corpo no espaço, visível. Há uma força no tempo, invisível. Uma força que movimenta o corpo. Um corpo que não entende, que não quer, que não se entrega, que resiste. Um corpo que tenta se segurar pelo olhar. Se segurar no que? Em quem? Um olhar inquieto, incrédulo que procura. O que? Quem? O fio foi perdido.