Geologia e paleontologia dialogam com as artes cênicas no espetáculo Ytá, que a Mostra Internacional de Arte Contemporânea (MIAC) apresenta sexta-feira (17) e sábado (18), às 20h, no Instituto Ling – entrada gratuita. A performance é fruto de uma pesquisa realizada ao longo de seis anos pelos artistas cearenses Bárbara Matias e Edceu Barboza na Bacia do Araripe, na divisa entre Ceará, Piauí e Pernambuco.
A obra traz à tona a exploração de minérios, como a pedra Cariri, e o comércio ilegal de animais e vegetais fossilizados da região – um dos mais importantes sítios paleontológicos do país, que abriga fósseis do Cretáceo, período geológico ocorrido há mais de 65 milhões de anos.
“Somos artistas interessados em pensar a cultura e o território como mote criativo de cena e dramaturgia. A paisagem visual e sonora da região nos afeta muito”, destaca Barboza, multiartista com formação em História e Teatro pela Universidade Regional do Cariri. O artista conta que um dos insights para o projeto foram as menções aos “pescadores de pedra”, nome dados à população que se dedica à atividade mineradora na região.
“Na maior parte do ano, esses ‘pescadores de pedra’ trabalham como agricultores. Em sua maioria, são pessoas pretas ou de origem indígena, parte delas da comunidade Mororó”, explica Bárbara, indígena do povo Kariri e doutora em Artes da Cena pela Universidade Federal de Minas Gerais. Ela destaca que a maioria dos trabalhadores se vê obrigada a recorrer à atividade, impulsionada por usos decorativos e da construção civil das pedras, por conta dos desafios climáticos e econômicos da região, agravados pela emergência do clima.

Durante a concepção do projeto, os artistas vivenciaram o dia a dia da mineração em contato direto com os trabalhadores e visitas ao Museu de Paleontologia Plácido Cidade Nuvens, em Santana do Cariri (CE). Ao longo desse processo, a dupla observou a dualidade de um contexto que apresenta, de um lado, o extrativismo descontrolado, de outro, a luta em torno da memória e das terras do povo Kariri.
Na visão dos artistas, a exploração desenfreada da mineração e o contrabando de fósseis são uma “ferida aberta” que dialoga com outros contextos de “herança colonial capitalista, ecocida e antropocena”. “Temos fósseis da bacia do Araripe, importantíssimos para a ciência brasileira, que foram roubados e estão espalhados pelo mundo”, afirma Barboza, relatando também iniciativas de repatriação – como o caso dos fósseis do dinossauro Ubirajara jubatus – e de educação ambiental e patrimonial que vêm sendo desenvolvidas na região.
A dramaturgia da performance – que se dá em duas versões: em um corredor, no formato cênico, com o público dividido às margens da cena; e em uma pedreira no Ceará – denuncia a relação predatória com o território e mergulha na cosmovisão dos Kariri em busca de outras perspectivas.
Quando: 17 e 18 de outubro de 2025Horário: 20h
Onde: Instituto Ling (rua João Caetano, 440 – Três Figueiras – Porto Alegre)Ingressos gratuitos no site do Instituto Ling