Volta e meia um modismo toma conta da Flor do Lácio – quem escreve passa a vida esperando a oportunidade de chamar a língua portuguesa de Flor do Lácio. Pois minha vez chegou. Quem lembra da época do “a nível de”? Tudo era “a nível de”, até o que não precisava ser, acabava sendo. A nível de novela, a nível de salário, a nível de calor, a nível de salsicha. Era ainda pior que falar de uma forma feia e pernóstica, era falar errado. E, pelo jeito, contagiava. Difícil quem não metesse um “a nível de” no meio da conversa.
Não sou nenhuma sumidade nas coisas da língua, o que me salva é ter aprendido o pouco que sei com os melhores, profe Fischer, profe Sergius, profe Moreno e tantos outros e outras igualmente grandes. Mas como resistir à vontade de palpitar? É por isso que trago aqui a dúvida que me acomete toda vez que paro para ver ou para ouvir um noticiário, uma entrevista, um comentário sobre política: por que, de uma hora para outra, surgiu essa mania de chamar os envolvidos em determinada situação de atores?
Sobre o talvez contato de Lula e Trump: demandará muito jogo de cintura dos atores.
Sobre o inaceitável extermínio dos civis em Gaza: os atores encontram-se diante de decisões cada vez mais urgentes.
Sobre a isenção do imposto de renda: quem conhece os atores, tanto de um lado, quanto do outro, não arrisca o resultado.
Sobre a Cop30: espera-se que os atores não se limitem a fazer anúncios, mas se comprometam com ações.
E por aí vai.
Cada vez que Trump é chamado de ator, Paulo Autran se revira. Bate uma amargura no Wagner Moura. Para sorte de dona Fernanda Montenegro, ainda não chamaram Carla Zambelli de atriz. Ainda.
Te cuida, Flor do Lácio.
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