Pular para o conteúdo

Letícia Wierzchowski na Casa da Memória

Letícia Wierzchowski na Casa da Memória
Hohlfeldt, Leticia e May | Fotos: Cristiane von Appen

Ouvir escritores pode ser como entrar na caixa de ferramentas para compreender a alma das engrenagens que sustentam grandes histórias.

Não se faz uma obra-prima sem truques de mágica estética.

A semana começou bem. Na segunda-feira à noite, na Casa da Memória, tendo Nilson May e Antônio Hohlfeldt como debatedores, a escritora Letícia Wierzchowski, consagrada com a Casa das Sete Mulheres, falou sobre as dores e delícias de roteirizar a obra de Erico Verissimo para o cinema. Ela fez o roteiro de O Continente para o filme de Jayme Monjardim e agora fará o de O retrato.

Em uma fala límpida, agradável e cheia de boas histórias, Letícia assentou a sua arte de “contadora de histórias”, nada mais interessante e necessário em literatura, no conceito de “supressão do estado de descrença”. O bom contador de história convence o seu leitor a tomar a ficção como verdade sem romper esse pacto. Letícia lembrou que o leitor está vendo algo triste na televisão, mas as suas lágrimas são pelo personagem que morreu no romance que está lendo. O seu filho adolescente contou-lhe chocado: “O capitão Rodrigo morreu”.

Essa é a beleza da arte de envolver o leitor.

Sobre roteiros para cinema, Letícia observou que é preciso transformar tudo em ação e imagem. Mas cada cena tem custos e operações complexas. Não se pode, como na literatura, explorar pensamentos como pensamentos. Ela elogiou a capacidade de Erico Verissimo de criar cenas em O Tempo e o Vento. O grande épico do Rio Grande do Sul é uma profusão de cenários, de situações cinematográficas e de episódios, com guerreiros e mulheres fortes.

Provocada a falar sobre gênero na literatura, Letícia contou que foi muita atacada, na época de A Casa da Sete Mulheres, por ser mulher e estar fazendo muito sucesso. Ah, o quanto o sucesso causa inveja! A escritora lembrou de alguns insultos que sofreu de figuras conhecidas do meio literários, cujos nomes não disse por generosidade. Um, no Rio de Janeiro, que lhe mandou encher o seu copo de gelo enquanto conversava sobre literatura no Rio Grande do Sul com um colega. Outro que achou certamente mordaz dizer que ela “era uma perua que escreve como empregada doméstica”.

Velho machismo gaudério.

Fiquei ouvindo enlevado. Sou fã da Letícia. Gostei da sua determinação em falar das coisas tristes trazendo à tona frases canalhas. Adoro o seu estilo de contar histórias. Ela fez questão de ressaltar a importância de Erico Verissimo na vida de escritora. Também elogiou muito o trabalho de Tabajara Ruas, como quem roteirizou O Continente. Ela acaba de roteirizar A Hora da Estrela, de Clarice Lispector, para uma história em quadrinhos. Para ela, O Tempo e o Vento é a obra seminal da literatura do Rio Grande do Sul, aquele que “ensinou os gaúchos a amar, a sonhar” e a lembrar.

A atividade da Casa Memória Unimed Federação RS inscreve-se no conjunto de homenagens aos 120 anos do nascimento de Erico Verissimo.

O mais famoso romancista gaúcho, com repercussão internacional, nasceu em 17 de dezembro de 1905 e morreu em 28 de novembro de 1975.

Foto: Cristiane von Appen

As opiniões emitidas por colunistas não expressam necessariamente a posição editorial da Matinal.

Juremir Machado da Silva

Juremir Machado da Silva

Jornalista, escritor e professor de Comunicação Social na PUCRS, publica semanalmente a Newsletter do Juremir, exclusiva para assinantes dos planos Completo e Comunidade. Contato: juremir@matinal.org

Todos os artigos

Mais em Opinião

Ver tudo

Mais de Juremir Machado da Silva

Ver tudo