O estudo técnico que irá servir de modelagem ao edital de concessão de parte dos serviços do Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae) ficará pronto apenas no ano que vem. O trabalho é realizado por técnicos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), instituição que confirmou a projeção em contato com a Matinal. Com a aprovação do projeto que autoriza a cessão parcial da autarquia, a oposição articula um movimento que quer envolver até a ex-presidente Dilma Rousseff para tentar frear a concessão.
A ausência do estudo técnico foi um dos pontos criticados pela oposição ao governo de Sebastião Melo (MDB) durante a sessão que aprovou a concessão parcial da autarquia, que entrou a madrugada desta quinta-feira. De fato, o estudo, hoje não existe, e sim está em elaboração. Em outubro, a prefeitura acertou um aditivo com o BNDES para a realização do trabalho. O montante empreendido pelo município pela modelagem é de R$ 1.333.333,33, oriundos de recursos próprios. O novo vínculo será válido até dezembro de 2027.
Originalmente, o BNDES foi contratado para elaborar um modelo de concessão à prefeitura em 2019, ainda durante a gestão Nelson Marchezan (PSDB) – que, conforme o Tribunal de Contas do Estado, precarizou o Dmae com fins de privatizá-lo. Em 2022, já ocorreu uma renovação do vínculo, com fins de ampliar os estudos técnicos relacionados ao abastecimento de água e ao esgotamento sanitário, segundo a prefeitura.
Os trabalhos foram interrompidos em razão da enchente. Com o fim do prazo então em vigor, houve o aditivo de agora, que irá reativá-los. “Passada a emergência, o projeto foi recentemente retomado. Com isso, está prevista renovação dos estudos em 2026, considerando os impactos dos eventos de 2024”, informou o BNDES, por meio de nota. Não existe, por ora, estimativa do período em que o estudo deve estar concluído, segundo o banco.
O levantamento a ser realizado terá dados relativos ao período da enchente. “Os efeitos desse evento climático extremo impuseram a necessidade de revisão estrutural das estratégias de prestação dos serviços públicos de abastecimento de água tratada, esgotamento sanitário e drenagem urbana no município”, menciona a nota, que afirma que a pesquisa irá seguir as Normas de Referência da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA).
Ruas quer Dilma contra a concessão
O BNDES é uma empresa pública federal vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços. Apresenta-se como o principal instrumento do governo federal para o “financiamento de longo prazo e investimento nos diversos segmentos da economia brasileira”. Atualmente é presidido pelo ex-ministro e ex-senador paulista Aloizio Mercadante.
Justamente o vínculo com o governo federal – que, neste momento, é mais favorável a um Estado grande em vez de privatizações – que foi apontado pela oposição como fator para barrar a efetivação da concessão do Dmae. O movimento é articulado pelo vereador Pedro Ruas (PSOL), que já durante a sessão indicou a criação de uma articulação diretamente com o BNDES para tratar do assunto.
O objetivo é simples: evitar que o BNDES empreste dinheiro a um eventual interessado contraia empréstimo junto ao banco para participar da licitação do Dmae, o que já aconteceu em outros casos de concessão ou privatização. “Eles não vão tirar dinheiro no Bradesco a (juros de) 4% ao mês, eles vão querer dinheiro do BNDES a 2% ao ano”, especulou Ruas. “O dinheiro do BNDES é do contribuinte, ou seja, público.”
Nos próximos dias, Ruas quer liderar esse movimento junto ao BNDES. O parlamentar avaliou que houve adesão à ideia a partir dos pronunciamentos dos colegas da oposição durante sessão desta quarta-feira. Para se tornar politicamente mais forte, o objetivo será agregar a ex-presidente Dilma Rousseff, que atualmente comanda o Banco do Brics, em uma conversa com o presidente do BNDES. Aloizio Mercadante foi ministro de Dilma durante a gestão dela no Planalto.
Ruas avalia que o movimento é coerente a partir da esquerda estar no poder em nível nacional. “Se essa concessão ocorresse durante o governo Bolsonaro, não haveria chances”, comentou. Para o parlamentar, sem o empréstimo, dificilmente a concessão parcial do Dmae sairia do papel. “Empresários que compram órgãos públicos não são empreendedores, são oportunistas”, criticou. “Eles querem o lucro sem o risco. Dinheiro público não é para isso.”
Vanuzzi projeta concessão válida a partir de 2027
Em setembro, às vésperas de deixar a direção-geral do Dmae e ser realocado na Secretaria Extraordinária de Projetos Especiais, Bruno Vanuzzi, falando a um público formado por empresários de Porto Alegre, estimou o lançamento do edital para “meados de 2026”, a licitação para o segundo semestre do ano que vem e o início do trabalho do eventual concessionário em 2027.
Conforme ele, apesar do tempo escasso até o prazo estabelecido pelo Marco Legal do Saneamento para a universalização do saneamento básico, dezembro de 2033, seria possível alcançar os 90% de tratamento de esgoto. Atualmente, de acordo com o Instituto Trata Brasil, Porto Alegre trata 55% do seu esgoto.
Pelo projeto aprovado pela Câmara, o município segue responsável pela captação de água bruta, enquanto que a futura empresa ou consórcio que assumir parte do Dmae terá como responsabilidade principal elevar o índice de tratamento de esgoto da capital.