A escritora Gisela Ranck, vai estar na 71ª Feira do Livro nesta quinta-feira (6), às 17h, para autografar o livro Gustav Prinz, uma vida sob o arco-íris. Lançado em setembro, a história narra a vida do bisavô da autora, imigrante alemão que veio ao Rio Grande do Sul.
Nesta conversa com o editor da Parêntese Luís Augusto Fischer, ela fala sobre a jornada para entender sua família e a história que eles construíram no Brasil. Até o final da Feira, 16 de novembro, a Matinal publica uma série de entrevistas com escritores e escritoras que participam da programação do evento. Leia aqui todos os conteúdos, e acompanhe as demais atividades da Feira do Livro de Porto Alegre.
Luís Augusto Fischer – Teu livro recompõe a trajetória do teu bisavô. Por que foi esse o assunto escolhido?
Gisela Ranck – A trajetória do meu bisavô Gustav Prinz e sua família não se parecia com a da maioria dos imigrantes alemães que se estabeleceram no Vale do Taquari; para nós, descendentes, tinha algo de fantástico. Mas não posso responder à pergunta da forma como foi colocada, porque, na verdade, eu não pensava em escrever um livro quando comecei a me ocupar do material antigo deixado pela família. Minha tia Sigrid, que veio morar comigo no início da pandemia, havia trazido consigo essas relíquias. Eu queria organizar as fotos, identificar os personagens e os lugares. Para reuni-las e compartilhá-las com os familiares, tive a ideia de criar um site na internet. Depois, resolvi incluir também os documentos e os cartões-postais. As cartas antigas eu já vinha transcrevendo e traduzindo do alemão para o português, para torná-las acessíveis aos parentes que não leem alemão, pois todos demonstravam interesse.
Li os muitos textos que meu bisavô havia escrito; selecionei, transcrevi e traduzi as partes que considerei mais significativas. Familiares começaram a me repassar as fotos e os documentos que tinham em seu poder e a relatar suas lembranças do passado. Com todas essas informações, que se somavam, se combinavam e se inter-relacionavam como num quebra-cabeça de mil pecinhas, a história do meu bisavô e de sua família — que eu inicialmente conhecia de forma vaga — foi tomando forma diante dos meus olhos. O envolvimento com o assunto foi justamente o que me levou a escrever o livro: eu precisava mostrar aos outros o quebra-cabeça montado.

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Fischer – Tu tinhas muitos documentos em família, assim como depoimentos. Mesmo assim houve alguma dificuldade na pesquisa e na redação?
Ranck – A parte mais difícil da pesquisa foi decifrar os documentos e cartões-postais escritos na chamada letra gótica cursiva (Sütterlin). Usando uma tabela de conversão, isso não seria tão difícil, caso as pessoas tivessem escrito todas as letras com perfeição — o que nem sempre aconteceu, pois frequentemente me deparei com garranchos e escritas apressadas. Para trabalhar as fotos e os documentos, precisei me esforçar para aprender um pouco a usar o Adobe Photoshop. Para a escrita em si, tive de retomar regras gramaticais da língua portuguesa — como, por exemplo, as de pontuação —, que andavam meio esquecidas. No conjunto, o processo foi puro prazer.
Fischer – Tu tens recebido retornos de leitores? Como tem sido a recepção? Está dentro das expectativas, acima delas, abaixo?
Ranck – Os parentes mais velhos da família, que conviveram com o avô/bisavô em Encantado, constituíam inicialmente o meu principal público-alvo. A recepção e os retornos por parte deles foram realmente calorosos, mas, quanto a eles, eu tinha certeza de que iriam gostar do livro. No entanto, também houve vários retornos positivos de pessoas mais jovens, familiares ou não, que superaram minhas expectativas. Entre esses retornos, diferentes pessoas me disseram que o livro prende a atenção, de tal forma que é difícil interromper a leitura. Disseram-me também que minha técnica narrativa impressiona; achei engraçado, porque, pelo menos conscientemente, não usei nenhuma técnica — apenas fui escrevendo... Duas leitoras diferentes, ambas descendentes de Gustav Prinz — uma mais velha e outra jovem — contaram-me, emocionadas, que reconhecem em si próprias a personalidade do antepassado retratada no livro. Um comentário lisonjeiro de um leitor: “Foi o melhor livro que li nos últimos tempos”. Um retorno muito interessante foi o que tive de um leitor agrônomo, que me contou que acha que decifrou o enigma do fracasso do parreiral de meu bisavô: na época houve um ataque massivo do fungo plasmopora viticola, um evento traumático que destruiu muitos parreirais da região. Teria sido legal eu saber disso antes.
Fischer – Tens outro projeto de livro, depois desse primeiro?
Ranck – Acalento a ideia de escrever um livro sobre minha avó, Carola Prinz, que foi pintora. Ela não se tornou muito conhecida além dos círculos familiares; afinal, era apenas uma mulher. Era do meu conhecimento que ela chegou a receber prêmios em exposições em Encantado e em Lajeado. Mais recentemente, após retomar o contato há muito perdido com familiares de um primo de minha avó, que morava em Porto Alegre, soube que ela também participou de exposições na capital. Chegava a Porto Alegre de ônibus com suas telas embaixo do braço e também ali teria sido premiada. Eu queria produzir um livro de arte, em formato grande, com reproduções coloridas de suas pinturas mais importantes e sua história de vida. Ainda não sei como colocar isso em prática. Por enquanto, tenho tentado reunir fotografias de todas as suas pinturas e desenhos, além dos dados correspondentes, em um site na internet, que ainda está incompleto. Sobre ela, já conto um pouco no livro sobre meu bisavô, mas há muito mais a dizer.
