Nas duas últimas revisões do Plano Diretor, em 1999 e 2009, o trâmite na Câmara de Vereadores da lei que regra o planejamento urbano de Porto Alegre durou dois anos. Desta vez, porém, poderá ser de apenas três meses. De acordo com a meta anunciada pela presidente da Câmara, Comandante Nádia (PL), a previsão é colocar os projetos do Plano Diretor em votação em 8 de dezembro.
A pressa após uma demora de cinco anos na revisão no âmbito do poder executivo, processo que foi interrompido pela pandemia e por disputas judiciais, é classificada como um retrocesso democrático na visão de representantes do Fórum das Entidades, que reúne 71 grupos representantes da sociedade civil que se cadastraram para participar do debate junto à Câmara – o fórum integra o processo de revisão do Plano.
Um relatório, com diversas críticas aos projetos do Plano Diretor Sustentável (PDUS) e da Lei de Uso e Ocupação do Solo (LUOS) e ao prazo exíguo dado ao debate legislativo das propostas, foi entregue nesta quarta-feira ao vereador Idenir Cecchim (MDB), presidente da comissão especial do Plano Diretor, nesta quarta-feira. Em anexo, também foram encaminhadas 113 emendas e dois pareceres, que serão analisados pela comissão especial.
O material, escrito pelas secretárias do fórum, vereadora Juliana Souza (PT) e Amanda Cardoso, do Sindicato dos Bancários, foi aprovado na véspera, por 37 votos a 14. Ainda que o Fórum das Entidades integre o rito da revisão do Plano Diretor, o relatório não demanda que seu conteúdo seja apreciado ou seguido. Cecchim disse que iria encaminhar as recomendações ao relator-geral do plano para a distribuição nos fóruns temáticos da comissão. “Após isso, ver aquilo que possa se transformar em emendas e levarmos ao plenário para serem discutidas”, explicou.
Desde que as minutas do PDUS e da LUOS foram apresentadas, em junho, houve duas audiências públicas, uma realizada pelo executivo e outra, pelo legislativo. As minutas foram consideradas inconstitucionais por um estudo técnico do Ministério Público, que prepara uma atualização mais aprofundada do conteúdo.
Pouco tempo e pouca representatividade
O relatório do Fórum de Entidades relaciona a redução do tempo de funcionamento e da representatividade entre seus integrantes como um retrocesso na comparação com revisões anteriores do Plano Diretor. Entre a instalação e a entrega do relatório, foram 11 reuniões em 40 dias, ritmo que, conforme a manifestação, atrapalhou na análise dos temas.
“O Fórum, enquanto instância participativa da fase legislativa da Revisão do Plano Diretor, não poderia limitar-se a cumprir uma agenda ‘pré-aprovada’ pela Comissão Especial, sem debate efetivo com a sociedade civil”, apontou o relatório, reclamando autonomia por poder ajustar calendário e metodologia. “A imposição de um calendário exíguo e inflexível fragiliza a legitimidade do processo, compromete a consistência do texto legal e desrespeita a trajetória participativa que sempre caracterizou o planejamento urbano da capital.”
Além disso, o relatório menciona que entidades, entre elas PreservaPOA, Instituto de Arquitetos do Brasil e Agapan apontaram a pouca participação territorial e social: “Essa assimetria compromete a pluralidade da escuta pública e reduz a diversidade de perspectivas sobre os impactos urbanos do novo Plano Diretor, reforçando a necessidade de mecanismos que assegurem a inclusão efetiva de comunidades populares e grupos historicamente sub-representados nas instâncias de planejamento urbano”, argumentou.
Ao longo de 16 páginas e seis capítulos, o relatório é concluído com quatro recomendações principais:
– Revisão integral do cronograma de tramitação legislativa;
– Criação de regimento interno próprio do fórum;
– Realização de uma nova rodada de audiências públicas antes da votação;
– Instituição de um sistema de monitoramento participativo.
“Prazo irreal e inexequível”
Autora do relatório e secretária do Fórum, a vereadora Juliana Souza disse esperar que o conteúdo seja acolhido pela comissão especial, principalmente com relação a pontos que apontou como fragilidades metodológicas e potenciais ilegalidades nos projetos.
À Matinal, a vereadora considerou o prazo projetado de tramitação na casa “irreal e inexequível” por conta do tamanho das propostas, que, para ela, ainda precisam ser melhor compreendidas pelos próprios parlamentares. “Garanto que há vereadores que sequer sabem a ZOT proposta para a região onde moram”, afirmou, referindo-se às chamadas Zonas de Ordenamento Territorial, uma novidade no plano, que estipula os limites de altura das regiões – em diversas regiões a permissão irá superar os 100 metros, o dobro dos 52m autorizados hoje.
De acordo com a petista, o prazo curto da tramitação na Câmara pegou a própria base de surpresa, fator que poderá pesar em prol de que a votação seja postergada. “Identificamos que há setores da base que não estão contentes ou contemplados com esse cronograma”, observou. “Não vemos que há consenso neste tempo acelerado.” Juliana Souza destacou também, que, além do relatório e das emendas, a comissão especial recebeu dois pareceres técnicos, um vinculado ao adensamento e outro às áreas de risco.
Outro fator que deixará o tempo apertado é a quantidade de emendas que o PDUS e a LUOS receberão. Até esta quarta, último dia para o envio de sugestões ao texto, haviam sido acrescentadas 109 emendas dos vereadores aos projetos. O número será atualizado nesta quinta.