Um projeto aprovado pela Câmara Municipal de Porto Alegre pretende colocar fim em uma prática registrada há anos na rede conveniada do Ensino Infantil da capital. Historicamente, profissionais que atuam como professores são contratados como técnicos de desenvolvimento infantil. O texto, protocolado pelo vereador Rafael Fleck (MDB), alcançou uma rara unanimidade na atual legislatura, na sessão da última segunda-feira. A estimativa preliminar é de que centenas de trabalhadores, que hoje recebem abaixo do piso para docentes, sejam impactados.
Conforme a matéria, as instituições terão 60 dias após a publicação da lei para se adequarem. Em caso de descumprimento da medida, as escolas ficam sujeitas à multa de R$ 2.885 por profissional desviado de função, além de penalidades, que podem acarretar até o fim do convênio com a prefeitura.
Atualmente, a rede conveniada do município é de 226 escolas, mais que o dobro das escolas próprias do município. A estratégia do convênio – ou “parceirização” conforme o termo bastante utilizado pelo prefeito Sebastião Melo (MDB) – visa a reduzir o número do déficit de vagas no ensino infantil na cidade. De acordo com Fleck, a futura lei beneficiará diretamente pelo menos cerca de 500 profissionais, que atuam como professores, mas são registrados como técnicos. O número é baseado em uma estimativa informal, segundo o parlamentar, e pode ser maior, chegando a aproximadamente 2 mil.
“A gente busca uma correção histórica”, comentou o vereador. “Imagina um professor com 25 anos de história na escola não poder ter a aposentadoria especial porque era registrado como técnico”, apontou, mencionando a condição especial que professores têm para se aposentar – de 25 anos de contribuição e, no mínimo, 57 anos para mulheres e 60 para homens.
Com a proposta virando lei, professores também terão respaldo maior para denunciar casos de irregularidades, na avaliação de Fleck. Além disso, ressalta o vereador, a futura lei vai ao encontro do que o prefeito Melo havia proposto à rede parceira há pouco mais de dois anos, ao aumentar o valor destinado às instituições. “Ele concedeu 5% de aumento desde 2023. Ainda assim, várias escolas ainda estavam com a nomenclatura técnica em desenvolvimento infantil, burlando o que foi acordado.”
Em 2023, a Matinal publicou reportagem sobre a situação, na época da criação do movimento “Professor Sim, Técnico não”, que denunciava a prática. Além de não acessarem os benefícios previstos especificamente para os professores, os chamados técnicos em desenvolvimento infantil ainda tinham uma carga horária maior de trabalho.
A presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA) e integrante do Fórum Temático da Educação Infantil, Carolina Aguirre, atribui ao movimento a construção que culminou na aprovação do projeto. “E ainda é um processo, porque tem uma resistência de algumas instituições ”, observou ela, que considera a lei um avanço.
Para Aguirre, a futura lei pode ser um estímulo para a redução de defasagem na contratação de professores. “Vamos ter mais profissionais que vão vir buscar as instituições para trabalhar conosco”, projetou. “É um reconhecimento ao professor, e vai melhorar a qualidade da educação infantil.”
Margot Andras, umas das diretoras do Sindicato dos Professores do Ensino Privado do Rio Grande do Sul (Sinpro), concorda, e destaca que a luta da categoria é antiga. “É um ganho muito grande para melhorar condições de trabalho e melhorar salário”, afirmou.
A expectativa é de que a sanção ocorra em breve. Em razão do período do ano, a lei passará a valer na prática em 2026.