Inaugurada em 2019, meses antes da pandemia do coronavírus que a abalou o mundo e parou a capital gaúcha, concebida pelo escritor e médico Nilson May, com a participação do seu parceiro constante, o também escritor e médico Alcides Stumpf, a Casa da Memória Unimed Federação/RS (Santa Terezinha, 263) tornou-se em pouco tempo, pela sua programação, um espaço privilegiado de exposições e de debates.
A história da arte no Rio Grande do Sul tem passado pelas suas salas, assim como acontecimentos importantes da vida de Porto Alegre. Em 2025, o centenário da exposição sobre os cem anos da Revolução Farroupilha (1835-1845), que deu origem ao parque mais conhecido como Redenção, foi destaque na Casa da Memória, atraindo muita gente.
Nesta época de cultura do cancelamento e de embates ásperos em torno de temas considerados sensíveis e polêmicos, a Casa da Memória se abre para discussões sem tabus. A liberdade de pensamento, à moda do grande John Stuart Mill, encontra nela abrigo e estímulo.
Nesta terça-feira, 16 de dezembro de 2025, a partir das 19h30, a Casa da Memória receberá o advogado e intelectual Marco Túlio de Rose para um diálogo incontornável: Monteiro Lobato era racista?
Conhecido por sua defesa da liberdade de expressão, De Rose lançou durante a Feira do Livro de Porto Alegre, pela editora AGE, uma obra de análise do tema: Afinal, Monteiro Lobato era racista?
Marco Túlio de Rose notabilizou-se na defesa de jornalistas da famosa Coojornal, uma cooperativa gaúcha de profissionais de imprensa que, no final do ciclo ditatorial de 1964, foi perseguida pelo regime e teve quatro membros presos acusados de violação de sigilo militar. O Coorjornal, mensário da entidade, publicava denúncias de tortura e outras ilegalidades cometidas pelos governos militares no poder.
Apaixonado pela obra de Monteiro Lobato, que povoou o seu imaginário de infância, assim como o de milhões de brasileiros, De Rose chamou para a si a discussão em torno do racismo do criador do Sítio do pica-pau amarelo. O seu argumento principal tem a ver com os valores da época. Julgar Lobato com os parâmetros de hoje seria cometer anacronismo: avaliar o passado com a régua do presente.
“Lobato falava dos negros, especialmente de Nastácia, como se falava dos negros no tempo em que escreveu a maior parte de sua obra infantil, anos 1920 e 1930. Se a adjetivação ‘negra’, ‘pretume’, ‘beiçuda’ trazia uma conotação negativa, isso não era importante para o autor, dentro da sua posição estilística de fazer com que as suas personagens infantis falassem e ouvissem falar como as pessoas falam”.
Esse é o núcleo da argumentação de Marco Túlio de Rose. Com o seu olhar de advogado, problematiza: “A acusação, neste sentido, parte do grave defeito de desconsiderar a evolução do seu pensamento politico e sociológico, que, neste sentido, partindo de Euclides da Cunha e passando por Gilberto Freyre, culmina em manifestações muito próximas dos autores contemporâneos que atribuem às causas socioeconômicas os males dos “Jecas Tatus da vida brasileira”.