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Fim do humano

De amizades e de de desenvolvimento tecnológico

Fim do humano
Juremir, Jean-Serge, Cláudia, Amparo, Clélia, Olivier, Heloise, Daniel, Philippe e Bertrand

Tenho amigos que se perpetuam. Em Nontpellier, Fabio La Rocca, Vincenzo Susca e Philippe Joron, amigos do peito, reuniram no colóquio Imaginário e Cotidiano uma turma que se conheceu em Paris nos anos 1990, na Sorbonne, Paris V, e nunca mais se largou, mesmo sem se ver, às vezes, por longos intervalos: Amparo Lasén, Bertrand Ricard e eu, além do próprio Philippe. Jantamos na casa de Olivier Cathus, outro amigo daqueles dias, que convidou também outro parceiro da nossa turma, Jean-Serge Vigouroux.

A eles se somaram o mexicano Daniel Gutierrez, as brasileiras Clélia e Heloise, esposas respectivamente de Philippe e Olivier. Lembramos de outros amigos que andam por seus países, o japonês Riozo, que tinha dificuldades para distinguir ocidentais: todos lhe pareciam iguais, o carioca-baiano André Lemos, professor consagrado da Universidade Federal da Bahia e da área da comunicação, o sul-coreano Choi, o senegalês Amadou.

Amparo Lasén leciona sociologia na Universidade Complutense de Madri. Bertrand Ricard trabalha na Universidade Reims Champagne-Ardenne, em Serviço Social. A paixão pela literatura e pelas ciências humanas nos liga. Compreender o cotidiano e seus imaginários é um elo que não se quebra. No colóquio, fizeram palestras brilhantes e originais sobre “laço social digital” e “heterossexualidade monstruosa e otimismo cruel”. Um show. Olivier Cathus conhece mais filmes hoje do que muito cinéfilo veterano.

Em Paris, fomos jantar com outro amigo daquela época de formação, o italiano Federico Casalegno, casado com a francesa Véronique. Federico foi pesquisador no MIT, em Boston, por duas décadas, que trocou por um cargo na Samsung, em São Francisco. Vive entre Paris, São Francisco, Seul e sua Itália natal. Sempre foi, com André Lemos, o cara da tecnologia. Eles fundaram no Centro de Estudos do Atual e do Quotidiano, dirigido por Michel Maffesoli, o Gretech, Grupo de Estudos em Tecnologia, quando a internet era uma novidade absoluta e era acessada por telefone. Tempos de pioneiros.

Estive num evento de Federico no MIT. Deve-lhe uma visita de lazer na Toscana. Toda vez que vamos a Paris, se está na cidade, ele nos convida para jantar, quase sempre em endereço novo. Desta vez, colado na Torre Eiffel. Houve uma época em que me hospedava. Conversamos sobre muita coisa da atualidade. Terminamos falando sobre Inteligência Artificial. Estou com um livro pronto intitulado “Sociedade pós-natural”. Em dado momento, depois de uma exposição de quem conhece o assunto sobre o desenvolvimento da inteligência artificial, que vai dar um novo patamar de competências cognitivas aos robôs, Federico, em tom neutro, tranquilo, disse: “Devemos estar vi vivendo a última geração do humano”. Eu subscrevo essa previsão.

Não se trata da morte dos seres humanos, do fim da humanidade, mas do ocaso do antropoceno, a era dominada de dominação humana sobre a natureza.

O trabalho humano, para bem ou mal, vai ser feito por máquinas.

O humano terá de deixar de ser faber para ser outra coisa.

Ludens, demens?

Uma ruptura de paradigma está em curso.

Já não somos os mesmos e não seremos como nossos pais.

As amizades e as admirações, porém, sempre serão humanas.

As opiniões emitidas por colunistas não expressam necessariamente a posição editorial da Matinal.
Juremir Machado da Silva

Juremir Machado da Silva

Jornalista, escritor e professor de Comunicação Social na PUCRS, publica semanalmente a Newsletter do Juremir, exclusiva para assinantes dos planos Completo e Comunidade. Contato: juremir@matinal.org

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