Confira todos os textos da edição #300
- Clássicos de agora e de sempre, por Luís Augusto Fischer
- O que pensam os escritores gaúchos mais lidos do século 21, por Luís Augusto Fischer
- Sobre a elitização da leitura numa livraria de shopping e a invisibilidade das livrarias de rua, por Marlon Pires Ramos
- O fim da literatura é o fim do mundo, por Paulo Damin
- É verdade esse bilete?, por Gonçalo Ferraz
- Narrativas porto-alegrenses: Dez histórias na cidade, por Luís Augusto Fischer
- Face a face com a barbárie, por Juremir Machado da Silva
- A coisa certa a fazer – Capítulo 10: Enfim, o estrangeiro, por Stela Rates
Entrei em conflito com o obscurantismo do governo de Jair Bolsonaro e perdi dois empregos. Hoje, às 15 horas, no Clube do Comércio, no âmbito da 71ª Feira do Livro de Porto Alegre, apresento meu novo livro, disponível nas livrarias virtuais e físicas desde 20 de outubro: Face a face: jornalismo de opinião em tempos de bolsonarismo (Editora Sulina). Às 16 horas, estarei disponível no Pavilhão de Autógrafos da Praça da Alfândega para quem quiser uma dedicatória.
Meu livro poderia ter como título “Censurados e autocensurados”.
Há textos que simplesmente foram bloqueados. Alguns, porém, eu já nem me atrevia a mandar. A censura corrói o corpo, a mente, a alma. Gera um estado de exaustão permanente. Cada dia se torna um combate, cada texto, uma aposta, cada frase, uma provocação, cada linha, um perigo.
O bolsonarismo continua fazendo estrago. A mortandade do Morro do Alemão, no Rio de Janeiro, foi estratégia eleitoral de um governador bolsonarista, Cláudio Castro, em busca de oxigênio para candidaturas de direita.
No auge do governo de Jair Bolsonaro, agora condenado e presidiário em regime domiciliar, a barbárie apresentava inúmeras faces e nem assim era percebida por todos. O negacionismo em relação à ciência foi a mais grave, retardando a compra de vacinas contra a Covid-19 e aumentando exponencialmente o número de mortos por falta de uma política firme e esclarecida de estímulo à prevenção contra o vírus.
Com o livro que autografo hoje encerro um capítulo. Se o poeta Pablo Neruda, ao olhar para a sua vida, adotou como título da sua autobiografia o famoso “confesso que vivi”, posso, sem autoindulgência, dizer “admito que perdi”.
Mas me sinto vitorioso.
Não perdi na vida, mas nessa refrega. Por encerrar o capítulo quero dizer que abraço definitivamente a filosofia estoica sintetizada na sabedoria popular da “vida que segue”. Levei algum tempo fazendo o luto desse episódio. Em outro combate, um dos envolvidos, me disse um dia: “Essa nós perdemos, companheiro”. Foi um profano remédio. O Brasil, contudo, pode perder de novo se flertar outra vez com a barbárie bolsonarista. O ano de 2026 será capital para nós.
O que é o bolsonarismo? Uma ideologia retrógrada que faz do combate à diferença o seu ponto de atração, estimulando o ressentimento, o ódio, a exclusão e a violência contra o outro, visto como inimigo, anormal, perigoso e estranho. O bolsonarismo é uma versão atual do fascismo mesclando nacionalismo e neoliberalismo. Na base, recusa a empatia, o conhecimento, a arte e a ciência.
Meu livro, feito de textos impertinentes ou inconvenientes para o jornalismo mainstream, apresenta um conjunto de textos desaguados no Facebook entre 2018 e 2022. A cada ano a sensação de solidão aumentava. Por fim, o tempo fechou. Não há heroísmo em perder. O fundamental é saber onde fica a saída de emergência. Outro alívio é excitar música boa. Eu me vejo ouvindo Edith Piaf: “Non, je ne regrette rien”. Ou o nosso Gonzaguinha: “Começaria tudo outra vez”.